quinta-feira, 23 de abril de 2015

Corpos





[Se ao menos pudesse desligar a consciência e ser
corpo]


Corpos, somente famintos por um outro.
Corpos, sujos da saliva um do outro,
esquecimentos físicos, abstrações carnais,
eletricidades livres, arrebatadores atómicos,
plurais lançados no vácuo cósmico.
Corpos, perdidos no calor um do outro,
mãos, lábios, e todo o enterrar da razão,
toda a inutilidade fonética das palavras.
Corpos, vivos num agora sem expressão,
num estar estando, num estar folgoso,
mais que presente,
fiéis ao segurar dos segundos contra a pele,
ao abraçar dos segundos contra a alma,
ao abraçar da mortalidade magnânima,
jovem, ingénua, suja, etérea, finita, eterna.
Corpos, fronteiras físicas de nós, celas, portais,
coisas que gravam dor, coisas que gravam prazer
e são luz em quartos fechados.
Corpos, gritos de carne, revoltas
contra a inércia pensante,
perecíveis vasos da alma que o adormece,
com saudades de si, acordam-se um no outro.
Corpos, poesias tácteis escondidas do mundo,
ritmos escalatórios, voos circunscritos ao infinito,
tremedores sísmicos, ladrões da respiração,
inquietações na noite, prisioneiros à sede,
Corpos, com planos de transcendências
Corpos inocentes, corpos lascivos
Corpos esquecidos de que são apenas corpos
( mas tudo disseram).



( Rascunho de Março )








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