28 de Maio de 2015
Florescemos. Ressuscitámos de cinzas quase
desvanecidas. Vivemos. Finalmente pegámos fogo, bom fogo
que nos alimenta e se expande descongelando as réstias de carne adormecida. Mas
isto consome, a distância semeia sede e fome de ti. Os dias são lentos e
percorro a tua memória obsessivamente com medo da dissolução dos seus
contornos, de cada segundo ao teu lado, de cada toque e cada corredor de
olhares. Talvez não consiga abarcar tudo isto, segurar todo este céu dentro de
mim. Excedes-me e tenho medo de querer tanto tocar-te sabendo que a tua
ausência queimará ainda mais. Isto consome mas agora sinto. E sentir é tudo.
Sentir enleva e dói, mas o enlevo faz-nos agradecer estar aqui. Agora sinto:
mais profundamente a vida em mim e mais acutilantes as horas sem ti somado ao
medo de te instalares demasiado no meu sangue e um dia já não esperares por
mim, assombrando-me as noites e desgastando-me as mãos que escreverão sempre
para fantasmas na esperança de lhes chegar e destes se fazerem humanos de novo,
amando-me de novo, esperando-me como espero. É nobre e trágico ser poeta e
sentir demasiado. Amar-te dói,
Amar-te dói mas
desenha-me no rosto sorrisos espontâneos.
Estás longe e num dia tudo acontece: Num dia
renascem mortos e num dia morrem recém-nascidos. É uma bela história - Numa
pequena cidade, dois desconhecidos apaixonaram-se. Podemos viver e morrer no
espaço de um dia. Deste-me vida e hoje tenho medo de morrer...morrer em ti, morrer
num dia em que a minha memória te seja fria e arrumada para um recanto de coisas
raras e, com sorte, descansada num altar de coisas intocáveis porque ambos
sabemos: tudo é perecível, mesmo histórias belas. Só cá dentro tudo permanece
magno, embebido em poesias maiores que a vida, texturas intransmissíveis,
difusas mas que segredam sentidos e revestem de juventude o coração. Só cá
dentro permanecemos anjos e nunca envelhecemos. Só cá dentro não degeneramos… as
palavras permanecem sagradas e os nossos risos ainda fazem dançar o ar.
Compreendo-te se tiveres medo deste amor - É
uma bela história, bela demais para mexer; Ficaríamos assim, imutáveis, numa
pequena cidade…
Al berto escreveu:
“quero
morrer
com uma
overdose de beleza”
Apenas a
beleza podia ressuscitar um peso morto. Apenas a beleza é digna de ser o berço
da tua morte (é justo). Por isso peço-te - Esvazia-me de novo
da minha razão. Faz-me de novo esquecer o tempo e levitar num quarto. Porque um
amanhã morremos e quero no passado cósmico uma eternidade a dois, prolongar-nos
através do tempo, gravar-nos além do nosso tempo, nós mortais sentindo-se
deuses, nós que nos incendiámos um ao outro e enviámos uma mensagem a um deus:
- ainda podemos ser vivos após tantas mortes…
- somos carne mas transcendemos sem medida que nos meça…
- estivemos aqui e foi tão bom…
- ainda podemos ser vivos após tantas mortes…
- somos carne mas transcendemos sem medida que nos meça…
- estivemos aqui e foi tão bom…
Ecoa em mim - “overdose
de beleza …” ;
Por favor: Sê a minha morte (só não me deixes
morrer em ti).
MF
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