sábado, 30 de maio de 2015



[Vives-me hoje no sangue]

(23/05/2015_01h12)

Tecemos todo o amor em dois dias
As montanhas abriram-se e achámo-nos,
no caminho
As comportas abriram-se e respirámos,
sofregamente o ar (contido exíguo por eras)
O céu olhou-nos e tateámos a vida,
um no outro
E renascemos…
miraculosas brisas de uma primavera quase extinta.
E renascemos…
sem saber que podíamos ainda viver,
sem saber que os lábios ainda pediam por Ser
eternos no olvido extático de um beijo


Vieste,
a pedra quebrou e sou sangue e carne de novo
faz-me o que quiseres.
assombra-me. queima-me.
rouba-me. mata-me.
se quiseres.
apenas prolonga tudo isto,
fervo de tanto sentir
aceito a saudade que me dói nas veias
aceito o medo, este medo sem nome
porque me crava expressão nos olhos e me grita
- estou viva

Matar-me-ás no final,
Mas não importa
- Impeles o meu corpo para a batalha dos dias
Durmo e acordo envolta numa espécie de paz
paz que me acalma e me destabiliza semeando
tempestades ansiosas e insónias
nas noites onde crescem ondas sedentas
por quebrar e no fim adormecer
com a lembrança do calor que chegou
quando se deram finalmente à costa

Vives-me hoje no sangue e acordo e adormeço contigo
Anseio de novo dois dias
Anseio de novo a ressaca de não nos ter
Porque a saudade engrandece-se nas horas lentas
Em que desenho o teu rosto no ar e beijo-te imaterial
Vamos ser os dois uma espécie de infância
Não penses,
Não tenhas medo,
Vamos ter a nossa infância talhada a partir de nós,
Do fundo de nós, dos gestos de nós
E do que flui e nos esquece do chão que pisamos
- Chão,
Foge-nos o chão e caio, caio em queda de trovão
Arrebata-se-me o peito e nunca estive tão inteira
Gritam-se iminências de desastres,
embates sónicos contra o muro
que pensámos poder transcender
com a confiança inabalável
de quem sentiu o amor outra vez
e achou-o ainda mais puro,
ainda mais grande.
Quase vislumbro o enorme oco deixado por ti
No fim, quando te fores
No fim, quando o sangue se te arrefecer
E os gumes dilacerarem-me a carne sem que os sinta
Quase me vejo a envelhecer de novo
E a escrever-te, em tons nostálgicos

Matar-me-ás no final,
Mas não importa
 - amar é morrer de tanto amar




MF    

to pb




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