quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016



Não te chega saber
que te deixaste, vislumbres vários do teu centro,
em versos polidos,
e indistintamente toda nos versos brutos,
na violência do ímpeto,
exorcismos escritos na inquietação da insónia

Não te chega saber
que já disseste quase tudo

porque ainda te fervem afinal milhões de palavras dentro
e vives, e choras, e colapsas, por detrás de um rosto imperturbável
porque queres que te vejam,
queres que te digam o que já sabes e mais ainda
- que não estás só,
E há uma infância simultânea à desumana lucidez….

*

O coração fez-se cérebro, queimo-me às vezes
de tanta lucidez,
e ao mesmo tempo anuncia-se uma vaga voz que me diz
que o que vejo é perturbação da visão,
descalibrada
irrevogavelmente limitada, fechada, viciada

E esta escrita é o oficio que soberbamente me acho herdeira,
ir ao mundo às vezes, e voltar e gravar
porque há quem asfixie sem poder dizer

E esta solidão é o destino certeiro que tento afogar
sinto tanto que não me aguento no amor
e apago-te a carne e faço-te impossivelmente deus
conservo e alimento e exponencio imagens,
pinto quadros com palavras
é tão bizarro como as coisas nos morrem na terra
como agora - quase que me morres e nem te vi o rosto
só ouvi a tua voz
(morre-nos tudo quando está perto)
a tensão acumulada quebra quando te ouço humano
és só humano, sou só humana, e isto às vezes é só isto
e fazemos epopeias em torno de um só beijo
e assombramo-nos, e matamo-nos, e sobrevivemo-nos
e sabemos das cinzas, e dos espaços entre-primaveras
o crescimento e o esfriar (inevitável?) dos sentidos
e dizemos adeus um ao outro porque nos queremos eternos.



MF



Sem comentários:

Enviar um comentário

  [Serás humano até ao fim] caminhas tocando as paredes numa divisão obscura os caminhos múltiplos, as escolhas pressionadas por um tempo de...