A geração de seres cansados
Os corpos suados
Biscates e contratos a prazo
Netflix depois do trabalho
A vida rápida
Pequenos almoços apressados
Amantes desencontrados
Filhos adiados
(Ou no berço já deitados)
Sonhos debaixo do sapato
Cães em apartamentos
Escuros, bafientos e apertados
A prestação do carro
Seguro, inspecção
Selo, combustível
Imposto sobre a circulação
A prestação da casa
A renda, a luz, a água
O gás, internet e smartphone
As propinas
A creche dos pequenos
(Se os há)
E outros impostos inventados
A prestação dos corpos
Dia a dia
'Homo laborants'
A manutenção meramente fisiológica
Fast food e enlatados
O entretenimento fácil
'A Piada infinita'
'O Amor líquido'
O vago espinho metálico,
Neoplásico
A magia somente reencontrada
Naquele velho clássico
'Les 400 cent coups',
'Cinema paradiso',
(Rosas no cume do espírito)
Saltamos refeições
Abraços e beijos
Saltamos caminhadas
Não sabemos mais do ócio
Benevolente
Da clareza transparente
De quem olha à janela
Suspenso sobre o tempo
Como na primeira infância
O mundo sem filtros,
prazos, créditos e consumos
O mundo sem futuro
O mundo assim mesmo
Sem papéis nem secretárias
Sem formulários ou currículos
Sem precariedade ou classes
Sem senhas, filas,
Rituais e rotinas
Sem o tempo fracionado a conta gotas
Sem enxaquecas
Frustrações e taquicardias
Obesidade e anorexia
Mindfullness e academias
Nicotina e cafeína
Aromaterapias
Psicoterapias
Benuron, Xanax,
Diazepam e Escitalopram
Ali, Amazon, Berska ou Shein
(Somas antevistas)
Subterfúgios e panaceias
Do cortisol nas veias
Do excesso de ruído
Os trabalhos noturnos e por turnos
Sem reformas antecipadas
Apenas antecipadamente
Surdos, cegos e mudos
Talvez a verdadeira doença seja afinal
Não querer parar
Para sentir
Esse mesmo lodo que queremos entorpecer
Ou dispersar
Com um comprimido mágico ou num bar
Num ciclo onde giramos
Rodamos e aceleramos
Sem engatar mudanças que acompanhem
A velocidade nova secular
Talvez a verdadeira doença seja
Não imaginar
Um futuro melhor
E não mais dançar no escuro
Eu queria
Construir uma família
Brincar na areia
Vivermos onde estamos e com quem estamos
Sem comentários:
Enviar um comentário