terça-feira, 27 de maio de 2014

Mil exércitos


  Num descampado vasto, defrontam-se mil exércitos. O céu reflete o caos abaixo e pinta-se carmesim. O ar poeirento está pesado e cheira a ferro e sal. Há elmos quebrados, cotas de malha perfuradas, estandartes caídos e espezinhados, cobertos de sangue e suor.  Os tambores bélicos são a sinfonia tenebrosa desse embate, o ritmo é frenético, a guerra prolonga-se durante anos e anos, com pausas breves de descanso. Não há vencedores, não há derrotados. Mil exércitos defrontam-se e os soldados vão sendo substituídos, à medida que sucumbem, exangues... que iras impetuosas vos impelem ao confronto? 
  Mil exércitos defrontam-se... na cabeça de um só soldado, caído numa estepe deserta, numa guerra que é, afinal, apenas sua. Está deitado em solo maculado mas sem ferida à superfície. Estéril a esperança de verde, esse campo se tornar. Houve um interregno na guerra dentro da sua mente, descansa um pouco, aproveitando fugaz alívio. Os seus olhos repousam agora no céu, onde projeta imagens vívidas, imagens de outro tempo, outra era - memórias de cores impossíveis, paisagens majestosas que, ardentemente e em segredo, deseja. Dor. Pudesse ele tocar esse céu...

MF

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