segunda-feira, 17 de novembro de 2014






às vezes crava-se-me um medo de não mais sentir o que senti
reminiscências vagas e acutilantes assaltam-me a cada dia
quadros distantes, podiam pertencer a outra vida,
transportam consigo a saudade intermitente
tão imensa, tão impossível de refrear,
transportam consigo a melancolia, praga que mata os dias

é como se tivesse tido a minha vez e tem de ser suficiente
e estes anos não são como os dos outros,
sou nova e já vivi

sussurra-me o instinto inimigo que não há mais para mim
quase me sinto bem aqui
mas quero aniquilar o quase,
às vezes ainda quero assaltar o exclusivamente humano
quero desejar, (desejar é tão humano)
quero sentir, (sentir é ser humano)

outro humano para me lembrar que sou humana,
duas explosões de sentidos latentes,
linguagens tão cheias e silentes

e pensarmos - "somos belos, viemos para a vida nos ver",
e incorporarmos um pedaço de eternidade nas nossas vidas
e vivermos a mil porque o tempo não espera por nós
e calarmo-nos quando as palavras ferirem
e beijarmo-nos porque o orgulho é para os fracos
e abraçarmo-nos porque acreditamos no amor
e escrevermos um ao outro porque somos poetas
e corrermos o céu com o olhar, duas galáxias diante mil,
e sentirmo-nos inteiros e livres,
cada átomo no seu lugar, abraçados
pela infinitude cósmica e pelo silêncio dos descampados

outro humano para me lembrar o que é amar,
duas mãos que abrandem as minhas,
uma voz que ecoe na noite e me roube o sono ou o embale

e pegar num caderno gasto e fazer poesia
e sorrir com a memória do meu nome nos teus lábios
e um ombro seguro onde a cabeça descanse de novo,
esvaziando-se de cada pensamento
até sermos jovens,
até lançarmos por terra cada filosofia,
porque estamos vivos e nada mais importa.

MF

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