os pássaros expelem serenos cantos
abrigam a paz e voam
tão alto
pássaros que quisemos ser, sem poder
porque somos humanos, assim,
mortal o chumbo, intrínseco a nós
enredados por um sem número
de inacabados gestos
e imaginados medos
dentro somos múltiplos
e fugimos da nossa própria sombra
quando a sombra devia
ser carregada em quatro mãos
os pássaros expelem serenos cantos
abrigam a paz e voam
tão alto
eu escrevi-nos
- vamos ser pássaros, vamos ser
deus, porque somos tão pesados?
neste chão germinam farpas
estou descalça e corro
como se tivesse asas
atrás de ti que me foges
deixando esquivos rastos
de coisas para me perder ainda mais
ao teu encalço, fustigada
pelos ramos
a pele lacerada, a ânsia, o amor a raiva,
vago medo de ir embora sem te ver
gritar-te adeus
e estares já longe
sem saberes o que corri
vago medo de voltar para trás
e diluíres-te para sempre
em tons gastos,
somente um fantasma que corria
diluíres-te para sempre
sem poder gravar contigo outro quadro
sem poder instaurar contigo a paz
em nós que nos desmembramos em círculos
e desaprendemos a arte de falar o que dói
bem sei: se te encontrasse seria a minha vez de te fugir
fechamos as cortinas um ao outro e morremos,
nunca nos encontraremos
somos abstracções de um dia
nos versos e na vida, amantes que se fogem,
*
escreveste-me poesia
escrevi-te poesia
para enganar a distância
que nunca se deixa enganar
imaginar-te não chega,
o corpo esfria
a cabeça dista
mas aqui estamos nós:
planando nas lonjuras
voamos sem nos tocármos
e não caímos
porque acreditamos no céu que voamos lado a lado.
MF
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