domingo, 9 de outubro de 2016
eu não sei explicar como estranhamente incorro
para interiores de perdição
e não expulso as imagens que me queimam
estou encadeada pelo seu brilho invertido,
opacidade, magnitude
estranhamente me lanço, pairo sobre a sombra
a morte, a decadência, a destruição
até à limpidez dos ossos
e há nada
e descubro que fui nada
e serei nada outra vez
e no espaço entre os nadas só há um nada onde não cabe o medo
um nada que não sei mas sei que não há medo
um nada com a semente espacial da vida
ocupei um nicho, uma linha lançada no infinito
eu irrompi não sei de que raízes, como sol fervendo
e hoje tenho gravado todo o passado humano
nos estremecimentos humanos
no pânico, nas visões quebradas com remates num beco
onde a razão embate e se desmorona
e então só me canta dentro uma voz sem nome
não é música nem palavras, não é voz, é um nada falante
e permanente, intemporal,
coisa que atravessou o universo
comigo sem eu saber
somente reconheço um eco
eu sei que sei
mas não sei saber
eu sei que sei
mas não sei dizer,
(então saberei?
se a candeia acende e se apaga no próprio instante em que se acende?)
e há somente uma nuvem, e esboços de pontes flutuantes
na aleatoriedade de um espaço infindo
veio de dia a resposta a todo o corpo, dissipando-se
mas eu vi na fulguração-apagão de tudo
acho que foi no mar
e numa noite se operou o milagre
e então acordei com a cabeça liberta
e sou meu corpo como minha alma desperta
(mas eu esqueci como viver nessa resposta)
os dias estão estendidos agora só para me ver, despir
camadas e peles que não são minhas
eu não sei se sei mas tenho a certeza
- que eu escolhi ocupar-me, ser-me,
meu outrora nada para luz ser.
MF
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